Saúde & Beleza

O El Niño no encalço da nossa saúde

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Ele está de volta. Após três anos de manifestação do La Ninã, agora é a vez do El Niño, seu“irmão”, marcar 2023 e 2024.O fenômeno climático assim batizado em homenagem ao menino (niño, em espanhol) Jesus, por acontecer próximo ao Natal, promove o aumento da temperatura das águas do Oceano Pacífico em pelo menos 0,5°C e eleva o nível do mar.Isso, é claro, impacta as nossas vidas de diversas maneiras.

No Brasil, por exemplo, agrande quantidade de água quente que se movimenta através da zona tropical do Pacífico em direção à América do Sulacarretará chuvas abaixo da média no Norte e no Nordeste, e mais volumosas no Sul e no Sudeste.Com a alteração do clima no planeta, os prejuízos ambientais e socioeconômicos deverão ser sentidos por muito tempo nas regiões mais afetadas. Pesquisadores do Dartmouth College, no estado norte-americano de New Hampshire,calculam que o prejuízo causado pela nova edição do El Niño à economia global poderá alcançar 3,4 trilhões de dólares (aproximadamente 16,6 trilhões de reais) nos próximos cinco anos.

A preocupação não para por aí.No dia 21 de junho, Tedros Adhanom, diretor-geral da Organização Mundial de Saúde (OMS), alegou que a agência tem se preparadopara uma maior disseminação de doenças virais associadas ao fenômeno. Estaremos mais vulneráveis a arboviroses comodengue, zika e chikungunya, isto é, enfermidades causadas por vírus transmitidos, na maior parte das vezes, por mosquitos.

Adhanom já alertou que eles se beneficiam coma alteração climática – os insetos se reproduzem mais, a incidência das doenças cresce. É o que vem acontecendo nas últimas décadas, em especial nas Américas.Recentemente, várias partes do Peru, que registra a segunda maior taxa de mortalidade por dengue na América Latina, perdendo apenas para o Brasil,declararam estado de emergência em virtude do aumento de casos. Um quadro tão grave que a Ministra da Saúde do país, Rosa Gutierrez, renunciou ao cargo na semana passada. O combo El Niño + Aedes aegypti, transmissor da doença, é uma verdadeira bomba-relógio.

Durante surtos como o enfrentado pelos peruanos, aos quais nós, brasileiros, também somos suscetíveis, a infraestrutura dos serviços de saúde fica sobrecarregada devido à enorme demanda por atendimento médico e não consegue acolher as necessidades da população. Vivemos algo parecido em março deste ano, quando os casos de dengue cresceram 43,8% em relação ao mesmo período de 2022 e a chikungunya apresentou alta assustadora de 97%. Para desenvolver estratégias de controle e redução de casos graves e óbitos, o Ministério da Saúde instalou um Centro de Operações de Emergências de Arboviroses (COE Arboviroses).

Entretanto, essa é uma providência emergencial. Em um país onde milhares de cidadãos vivem em miséria, sem água encanada de forma regular, sem coleta de lixo, a tendência é mesmo a de que enfermidades se proliferem. O fortalecimento das medidas de controle populacional dos mosquitos, além depassar pela orientação às pessoas–manter caixas, tonéis e barris de água bem tampados, não jogar lixo em terrenos baldios, e outras ações -, exige que o poder público esteja atento às condições em que elas vivem. Afinal, seja em períodos de eventos climáticos extremos ou não, os desamparados pelo Estado são obrigados ase descobrar para escapar das doenças.

Em situações semelhantes, a vacinação desempenha papelcrucial. Impulsionada pelo El Niño,a epidemia de febre amarela em Angola, em 2016, é um exemplo: lá, a imunização foi importante parareduzir os casos e mortes. O nosso Instituto de Tecnologia deImunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz) chegou a fornecer um milhão de doses de vacinas para o país.

Agora a boa notícia está conosco. Na semana que vem, chegará a clínicas privadas o primeiro imunizante contra a dengue que independe de infecção prévia pelo vírus a receber registro no Brasil – temos a vacina do laboratório francês Sanofi Pasteur, mas ela só pode ser aplicada em indivíduos que já contraíram a doença. A eficácia da nova vacina, batizada de Qdenga, foi de 80% em testes clínicos.

Por enquanto, como o custo varia entre R$ 350 e R$ 500 por dose, será privilégio para poucos. Resta esperar que o Ministério da Saúde, após avaliação do produto pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS,a disponibilize a toda a população. Para enfrentar um mundo cada vez mais hostil, quente e desigual, vale adaptar a célebre canção dos Titãs. A gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte – e vacina no braço.

Antonio Carlos Lopes, presidente da Sociedade Brasileira
de Clínica Médica

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