Em regra, no Brasil, o aborto é considerado crime, previsto nos artigos 123, 124, 125, 126 e 127 do Código Penal Brasileiro. Contudo, a legislação permite o aborto provocado em algumas situações: (i) se não há outro meio de salvar a vida da gestante (aborto necessário); (ii) no caso de gravidez resultante de estupro, mediante consentimento da gestante ou de seu representante legal; e (iii) se for caso de anencefalia fetal. Nessas hipóteses, o aborto poderá ser realizado seguindo o Procedimento de Justificação e Autorização da Interrupção da Gravidez, nos termos da Portaria de Consolidação GM/MS nº 5, de 28 de setembro de 2017.
É sabido contudo que mulheres recorrem ao aborto provocado, de forma clandestina, mesmo em situações não permitidas pela legislação, o que as expõem a riscos e complicações, que as levam a buscar os pronto-atendimentos dos serviços de saúde. E o médico que a atende, por vezes, pode ficar inseguro por não saber como deve conduzir a questão.
Por isso, é importante esclarecer que a SOGESP orienta que caso o médico se depare com o atendimento de mulher com suspeita de aborto provocado clandestinamente, mesmo em situações não abrangidas pelo aborto legal, deve ser mantido o dever de sigilo e o caso não deve ser denunciado à polícia.
O Código de Ética Médica prescreve, dentre seus princípios fundamentais, que “o médico guardará sigilo a respeito das informações de que detenha conhecimento no desempenho de suas funções, com exceção dos casos previstos em lei”. E estabelece claramente no artigo 73 que é vedado ao médico revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento do paciente.
Portanto, no atendimento a mulheres com suspeita de aborto provocado, o médico deve acolher a paciente, esclarecer dúvidas através de uma anamnese completa, seguida de exame clínico-obstétrico.
Descartar traumas físicos que podem acompanhar procedimentos de aborto clandestino, como trauma vaginais, cervicais e uterinos. A seguir, avaliar a necessidade de exames laboratoriais complementares, como hemograma completo, PCR, sorologias, tipagem sanguínea.
Quanto a exames de imagem, o ultrassom transvaginal normalmente é o suficiente, salvo em casos de traumas em que exames mais apurados poderão ser necessários. Quando o aborto não foi completado por retenção de restos ovulares, será necessário realizar o esvaziamento uterino, através de curetagem ou aspiração manual intrauterina (AMIU). Para os casos em que o aborto não foi efetivado, encaminhar a serviço de seguimento pré-natal, orientando medidas imediatas para proteção infecciosa em caso de manipulação uterina e oferecer suplementações específicas bem como exames subsidiários compatíveis com a idade gestacional. Ao final do atendimento, oferecer primeiras orientações de planejamento familiar e encaminhar para acompanhamento ginecológico, no intuito de se evitar novas gestações não planejadas.
O médico deve fazer o registro completo e cuidadoso do atendimento no prontuário, que deve ser mantido em sigilo, independente de suas convicções pessoais sobre a questão. Conforme determina o parágrafo 1º do artigo 87 do Código de Ética Médica. O prontuário deve conter os dados clínicos necessários para a boa condução do caso, sendo preenchido, em cada avaliação, em ordem cronológica com data, hora, assinatura e número de registro do médico no Conselho Regional de Medicina.
A SOGESP entende que a prioridade do médico ginecologista e obstetra deve ser sempre garantir a adequada assistência à saúde da mulher, bem como seu acesso à rede de atendimento de apoio. Em razão do sigilo médico, grande parte das pacientes sentem maior tranquilidade em compartilhar suas vivências com profissionais médicos e de sua confiança. A comunicação à autoridade policial fere a autonomia feminina além de promover inibição da procura aos serviços de saúde com prejuízo à assistência médica adequada.
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