Coluna

Os números impressionantes da violência no Brasil

Os números impressionam: notícias recentes divulgadas pela mídia revelam que o Brasil poderá ultrapassar a marca histórica de 60 mil homicídios em 2017! Não se tratando apenas de meras conjecturas numéricas, friamente calculadas, estamos falando de uma verdadeira guerra interna que está às nossas portas, mesmo que, por sorte ou por possuir mais meios para nos defendermos de situações violentas, nunca tenhamos presenciado ou nos envolvido num conflito ou em episódios do gênero!

Impossível elencar e analisar em um único artigo ou até mesmo em um volumoso tratado todos os fatores que levam o ser humano à agressividade contra os seus semelhantes (ou contra os animais). Se aceitarmos a hipótese de que inicialmente habitávamos as selvas e depois, num longo processo, fomos obrigados a viver em bandos com regras precisas de convivência, oralmente transmitidas e, em seguida, codificadas em leis que se tornaram o auge do que comumente chamamos de civilização, precisamos também admitir que o animal selvagem que está em nós se manifesta esporadicamente todas as vezes que os nossos instintos são provocados ou estimulados de maneira inadequada.

Tomando como provável a afirmação do parágrafo anterior, pode parecer impossível solucionar o problema da violência humana. No entanto, é bom não esquecer a lição de Ítalo Calvino que nos convidava a não aceitar passivamente o inferno social em que vivemos, e sim buscar possíveis paraísos dentro dele. Para encontrar tais paraísos, devemos atenuar, minimizar e, em certos casos, controlar adequadamente os instintos que nos levam à agressividade. Mas de que modo podemos fazê-lo e com quais meios?

Certamente, não há outro modo ou ao menos ainda não se descobriu um modo melhor que o apelo a instituições de controle social, normalmente aceitas pela sociedade. Há os que devem escrever as leis e há também os que devem mandar aplicá-las; há os que devem reprimir, quando necessário, e da maneira correta, os que se recusam a aceitar as regras. Periodicamente, as regras devem ser revistas , adaptando-as aos costumes dos tempos, mas sempre respeitando normas mínimas de convivência, baseadas em tolerância e respeito. Enfim, é necessário constituir sistemas que vigiem e controlem os responsáveis pela vigilância e pelo controle, a não ser que se acredite (ainda) que tais pessoas sejam diretamente escolhidas por Deus e, portanto, só a Ele devem prestar contas.

No Brasil atual as instituições, as leis, os que vigiam, os que devem vigiar e os que devem reprimir ou controlar estão em crise ou estão quase completamente ausentes. Não é difícil, portanto, apostar num aumento constante da violência, pois os que não conseguem reprimir os instintos (porque não receberam adequada formação para reprimi-los ou, ao menos, para atenuá-los, ou porque se encontram em ambientes familiares desestruturados ou fortemente sujeitos ao apelo das drogas e a outras formas de alienação incitadoras de violência), não encontrando assistência, amparo ou obstáculos, tendem a expressar-se de maneira socialmente inadequada, isto é, que não leva minimamente em consideração o direito a vida e à liberdade do outro, seu semelhante, sujeito às mesmas pressões cotidianas e incessantes.

Eliminar a violência entre os seres humanos é uma tarefa impossível, pois, mesmo nas condições ideais de uma sociedade ideal, sem desníveis sociais e com instituições em perfeito funcionamento, o animal selvagem que em nós habita encontrará a ocasião propícia para despertar e cometer atos aparentemente inexplicáveis. Cabe, porém, retomando mais uma vez as lúcidas palavras de Calvino, não aceitar passivamente tal condição que nos foi imposta pela “Mamãe-Natureza” e arregaçar as mangas, trabalhando incessantemente para que as instituições funcionem, discutindo e revendo continuamente leis e normas, evitando radicalismos, polarizações maniqueístas, apelos sedutores e demagógicos a supremacias de qualquer natureza, ideológica, religiosa ou étnica, para evitar que cheguemos ao absurdo de uma guerra não declarada entre cidadãos de um mesmo país, com vítimas inocentes e frequentemente muito jovens.

Sérgio Mauro é professor da Faculdade de Ciências e Letras da Unesp de Araraquara.

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