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Hortolândia tem escola bilíngue para surdos

 

Imagine um mundo onde os gestos dizem mais do que palavras. De pessoas que trazem na expressão do rosto sentimentos verdadeiros. Gente que nunca ouviu o canto dos pássaros, mas que percebe a vibração do próprio coração como uma canção. Esta é a realidade da pessoa surda*, em especial, da criança que aprende a conviver e a se comunicar com os demais num mundo de silêncio. Nesta quarta-feira (26/09) é comemorado o Dia Nacional do Surdo e a cor do mês é o Azul. Para marcar a data, a Prefeitura de Hortolândia apresenta o Projeto Escola Bilíngue, desenvolvido na Emef (Escola Municipal de Ensino Fundamental) Renato Costa Lima, no Jardim Amanda, onde, há quatro anos, existe um pólo de alunos surdos e a oferta de atendimento especial em Libras (Língua Brasileira de Sinais).

A ideia de manter numa escola municipal a maioria dos alunos surdos atende recomendações de especialistas e legislação nacional (Lei 10.436/2002 e Decreto 5.626/2005) que aponta que o atendimento de surdos em grupos favorece o desenvolvimento linguístico, no caso, a Libras como primeira língua e o português como segunda língua. Na Emef Renato estão matriculados, atualmente, 13 alunos surdos, das 16 crianças no Ensino Fundamental de Hortolândia (a cidade tem outros três alunos surdos na EJA – Educação de Jovens e Adultos, e dois na Educação Infantil). “Esta é mais uma política pública assertiva, de um governo compromissado com uma educação verdadeiramente inclusiva, visando a construção de uma sociedade mais justa”, ressalta a secretária de Educação, Ciência e Tecnologia, Alessandra Amora Barchini.

Um dos alunos surdos na Emef Renato é Matheus Vinícius Porto Custódio, de 10 anos, que está no 5º ano. Filho caçula em uma família com cinco irmãos, ele é a segunda pessoa com surdez na família. Por este motivo, foi ensinado Libras desde a infância. “É muito positivo quando a criança aprende Libras em casa, desde muito pequena, porque ela se comunica de maneira formal. A maioria das crianças, no entanto, aprende apenas gestos, muitas vezes criados pela própria família. Num grupo de surdos, gestos não têm significado. É como se aquela criança fosse estrangeira: ela não entende e não se comunica”, explica a diretora da escola, Luceli Grisante.

Libras

A Libras foi reconhecida como língua em 1960, nos Estados Unidos. No Brasil, a regulamentação da Libras por meio de legislação nacional ocorreu em 2005, tendo como principais orientações a oferta desta língua como disciplina curricular; o ensino da língua portuguesa oferecida aos alunos surdos como segunda língua; e a formação de profissionais bilíngues. O Ines (Instituto Nacional de Educação de Surdos), que é o órgão do Ministério da Educação responsável por subsidiar a formulação da Política Nacional de Educação de Surdos, estima que no País existam mais de 9 milhões de pessoas surdas.

Por ser uma legislação ainda recente, a oferta de Libras nas escolas da rede pública ainda esbarra na formação de profissionais aptos a ensinar nesta língua. Em Hortolândia, no entanto, a Secretaria de Educação, Ciência e Tecnologia dribla este desafio com a promoção de cursos e oficinas, tanto para os profissionais envolvidos no Projeto Escola Bilíngue quanto para a comunidade em geral. “Há um curso que é aberto a toda população e acontece no Centro de Formação dos Profissionais em Educação Paulo Freire, com inscrições todo início de ano. Aqui na nossa escola, os professores e demais funcionários também aprendem Libras durante a realização de trabalhos pedagógicos. Nem todos são fluentes, mas conseguimos nos comunicar muito bem com os alunos. Além disso, contamos com duas professoras de educação especial e uma educadora infanto juvenil, fluentes”, destaca a diretora.

A educadora Agnes Laudino Batista de Oliveira é querida por toda a escola. Mas entre os alunos surdos, ela é sucesso garantido. Dá bronca, resolve conflitos e ajuda no que for preciso. Ganhou até um sinal próprio (espécie de apelido entre os surdos). “Eles se referem a mim com um sinal em que batem a mão na altura do pescoço e ‘fazem’ um cabelo cacheado. O sinal é algo que lembra a pessoa”. Foi ela quem ajudou na entrevista com o Matheus, cujo sinal é um gesto com o polegar e o dedo mínimo unidos, passando os dedos indicador, médio e anelar na testa, como se estivesse aliviando um suor depois da brincadeira. E como brinca! Enquanto falava por meio de Libras com um amigo, também surdo, corria e fazia estripulias como qualquer criança da idade.

Matheus e os demais alunos surdos participam das mesmas atividades que os alunos ouvintes: educação física, recreio e aulas na classe. Não há distinção de lição e o tratamento dos professores é o mesmo. A professora Andria Damares Silva cuida da turma de 1º ano e tem três alunas surdas. “Esta é uma classe de alfabetização. A meta no final do primeiro ano é que os alunos reconheçam números, cores, letras e sinais básicos. No caso da minha sala, inclusive Libras. Apresento a aula oralmente, da forma tradicional, e auxilio as alunas surdas com Libras. O interessante é que os coleguinhas aprendem junto e todos caminham no mesmo ritmo, na alfabetização e na língua de sinais”, comemora.

As alunas da professora Andria não conheciam Libras antes de estudar na escola e tinham muita dificuldade de comunicação. Vencida esta etapa inicial, as estudantes estão completamente integradas à turma e já se comunicam até com os alunos mais velhos, das outras salas. “Tenho alunos ouvintes que pesquisam Libras na internet para se comunicar melhor com os amigos. Para estas crianças, é um privilégio conviver como igual com alunos surdos e perceber que todos têm a mesma capacidade de aprendizagem, a mesma desenvoltura para aprender. Tenho convicção de que estou colaborando para a formação de uma sociedade melhor”, enfatiza Andria.

Superando defasagens

Para os alunos surdos que têm maior dificuldade com o conteúdo trabalhado em sala de aula, a escola promove, uma vez por semana, uma atividade integrativa onde todos se reúnem com a professora de educação especial, designada para promover atendimento especial, exclusivo em Libras. “Os alunos têm orientações pedagógicas para corrigir eventuais defasagens e podem interagir de forma mais espontânea”, destaca a diretora da escola, que explica que o processo de avaliação do aluno surdo é diferenciado. “A avaliação leva em conta a evolução da criança”, afirma.

Mas tirar boas notas não é problema para o Matheus. Ela conta que é muito bom aluno e que gosta de estudar. Entre as atividades preferidas na escola, está pintar e comer a merenda. Sobre os amigos, ele diz que gosta de todo mundo e não vê diferença entre quem é surdo e ouvinte porque “todos brigam igual e brincam igual”. No futuro, adivinha o que o Matheus quer ser? “Professor, ensinar outras crianças”, mostra em Libras. Inspirador.

CONVITE

A Emef Renato Costa Lima convida toda a comunidade a conhecer mais sobre o Projeto Escola Bilingue e participar do evento comemorativo ao Setembro Azul, nesta quinta-feira (27/09), às 15h. A atividade, no pátio da escola, contará com apresentação de malabarista, teatro, contação de histórias traduzida em Libras e exposição de trabalhos produzidos pelos alunos. O endereço da escola é Rua Santos Dumont, nº 45, Jardim Amanda.

*A pessoa surda é aquela que não escuta e utiliza língua de sinal para se comunicar. Ela é deficiente auditiva. Porém, nem todo deficiente auditivo é surdo.

Este artigo foi enviado pela Prefeitura de Hortolandia

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